segunda-feira, 29 de outubro de 2007

Cinecaolho :: segunda, 29 de outubro de 2007

CINEASTA BOM É CINEASTA MORTO
de Luiz Pretti
Ficção, 14min, 2007 (estréia)

JARRO DE PEIXE
de Salomão Santana
Ficção, 15min, 2007

Após a exibição dos curtas haverá debate com os realizadores.
Local: Casa Amarela Eusélio Oliveira, Cine Benjamin Abraão
Horário: 19h

O Cinecaolho é um cineclube organizado pelos alunos da Escola de Audiovisual de Fortaleza e acontece toda segunda-feira na Casa Amarela. A entrada é gratuita.

sexta-feira, 19 de outubro de 2007

Fortaleza, 19 de outubro de 2007



Numa manhã abro os olhos e enxergo o passado.
Lugar distante do meu livre pensamento...sem eco...sem sombra.
Hoje perco-me no vazio do caos e tenho a esperança de me aprisionar para sempre...com eco...com sombra...


Victor de Melo
Fotógrafo de vídeo e still e aluno da Escola de Audiovisual de Fortaleza

terça-feira, 9 de outubro de 2007

Tropa de Elite, por Pedro Diógenes

“Tropa de Elite” é o filme mais importante do Brasil dos últimos anos! Aqui não importa se ele é extraordinário ou péssimo. O que importa é que ele esta sendo visto e discutido. Ele esta sendo visto por todos, não importando a classe social, a crença, idade, interresse pelo cinema e o nível cultural. E eu estou falando de um filme que ainda não foi lançado no Cinema!!! “Tropa de Elite” é um fenômeno que precisa ser entendido, pois além de ser muito visto, ele é motivo de conversa, e muitas vezes discussões, por todos. Discutir “Tropa de Elite” é discuti a violência nesse país. Faz duas semanas que eu não passo um dia sem falar nesse filme. Pessoas que nunca conversaram comigo sobre cinema vêm me perguntar se vi esse filme.

A violência no Brasil já produziu números e notícias inacreditáveis, mas nunca se discutiu tanto a violência como com o filme. Será que a ficção levanta mais discussão que a realidade? É o poder do cinema, e estamos falando de um filme que coloca a violência em primeiríssimo primeiro plano.

“Tropa de Elite” é a visão de um policial sobre a violência nos morros do Rio de Janeiro. Esse policial é o narrador onipresente do filme. Ele não pára de falar um só instante e sua opinião fica bem clara: ele acredita que só a violência pode combater a violência, chama sua corporação de seita, tortura mulheres e adolescentes, humilha desumanamente seus subalternos, mata, coloca a culpa da violência nos jovens de classe media que fumam maconha e quer que toda essa violência se perpetue achando um substituto que seja a “altura” dele.

Duas conclusões consigo tirar rapidamente após ver o filme: a) esse personagem é um assassino perigoso para a sociedade que pensa que é Deus e deveria estar em um manicômio se tratando; b) e que está na hora de se pensar na descriminalização das drogas.

Fico impressionado que muitas pessoas se identificam com o personagem, acham que ele age certo e que ele é uma espécie de herói. “A pessoa gostar ou não de um filme fala muito mais da pessoa do que do filme”. Adoro essa frase dita em sala pelo professor Alexandre Veras e acho que ela poderia se adaptar para o momento e ficar assim: Um filme ser um fenômeno em um País fala mais do País do que do filme.

“Tropa de Elite” é um fenômeno que precisa ser entendido.



Pedro Diógenes

Realizador de Audiovisual e aluno da Escola de Audiovisual de Fortaleza


sábado, 6 de outubro de 2007

A Direção de Fotografia, reflexão de Gilles Weyne

Desde que Narciso era Narciso e o homem era homem, ele sempre se apaixonou pela sua própria imagem.Desde as pinturas rupestres, o homem sentiu a necessidade de se representar e, por tabela, de se ver representado. A necessidade de se ver e o regozijo que isso lhe proporciona sempre foram fontes de inspiração e motivos para representar-se (a si mesmo ou a seu semelhante) seja numa obra estática (como um quadro, uma fotografia) seja numa obra em movimento (como uma peça de teatro). Representar-se num filme atinge então um grau de perfeição (não necessariamente de fidelidade) dificilmente alcançável por outra arte: o homem se representa em movimento, mas de maneira reproduzível, que se possa ser vista da mesma maneira inúmeras vezes. Porém, a sua representação e a imagem que ele tem de si mesmo dependem do seu ponto de vista (ou ângulo) não só metafórica, mas fisicamente também.

Deus criou o homem à sua imagem, dizem certas religiões; Deus criou o homem, dizem todas. Independentemente do seu credo, o homem (sem necessariamente ser religioso, basta ele viver numa sociedade fundada em conceitos religiosos)não só se vê ao ver o seu semelhante (e vice-versa: vê seu semelhante ao se ver), mas, principalmente, vê (seja em si mesmo seja no seu semelhante) a obra do seu Deus (ou da evolução darwiniana da sua espécie que seja). Ou seja, ao se ver, seja no espelho, seja na tela, o homem tanto se vê quanto vê a humanidade como um todo, como parte de um todo (seja esse todo fruto da criação de um Deus, seja ele devido às forças da natureza e dos anos).

As pinturas, das rupestres parietais às sofisticadíssimas renascentistas, só corroboram o fato de que o homem não só sempre gostou de se ver representado, como sempre gostou de se representar (seja no palco, na parede, no quadro ou na tela). Da mesma forma que quando o homem se vê, ele vê a humanidade como um todo, quando o homem se apresenta (no palco, no set) ou se representa (no quadro, na tela) ele representa ( ou apresenta) a humanidade como um todo: ao representar-se(apresentar-se), o homem representa a humanidade, ou seja, representa a criação do seu Deus ou (para os mais ateus) a evolução lógica da vida na terra.

A fotografia, como advento científico, só tornou mais acessível à maior parte da população a contemplação de entes queridos ou de si mesma (num último suspiro narcisista). O cinema é só, por tabela, uma representação, por mais em movimento que seja, de uma suposta realidade (como um retrato renascentista representa supostamente alguém, apesar desse “alguém” ter ficado parado, de fato, horas a fio). Realidade suposta ou porque se trata de um tema, por mais real que seja, reencenado, ou porque se trata de uma ficção, puro e simplesmente. Mesmo que o tema abordado não seja nem reencenado nem uma ficção, ou seja, mesmo que o tema seja um documentário; a escolha dos ângulos, das luzes, do som e, quem dirá, dos entrevistados, não deixa de ser uma suposta realidade.

O Homem gosta de se ver, gosta de ver o outro: o Homem gosta de ver (seja pelos olhos, seja através de outros sentidos: o Homem gosta de se comparar: da mesma forma que um deficiente visual vai tatear o rosto do seu interlocutor para “dar um rosto à voz”, se eles tiverem um mínimo de intimidade). A maior parte das deficiências inclusas, o Homem gosta de perceber. E se ele gosta de perceber o outro, ele gosta de ser percebido. Se ele gosta de assistir à humanidade, ele gosta de sentir que faz parte dela. Só dessa forma ele se sente como parte dela ou, pelo menos, à imagem dela.

Quando Narciso se viu espelhado no rio e se apaixonou por si mesmo, não podemos, como estetas, deixar de nos perguntar como ele se viu. Se Narciso estava, como diz a lenda, debruçado sobre o rio; tudo indica que o rosto dele estava na sombra, ou, no mínimo, numa penumbra: ou seja, apesar de estar em contra-luz, Narciso apaixonou-se por si mesmo. Afinal, ele, mais do que ninguém, sabia que o que lhe importava não era a luz, e sim a imagem (no caso, a do próprio rosto refletida).

Talvez não seja à toa que eu tenha me diplomado em escultura, porque o meu pai sempre foi um fotógrafo diletante e sempre me ensinou a encarar essa forma de representar o mundo como uma forma de expressão da subjetividade. Tanto ele me ensinou a fotografar quanto eu herdei a máquina fotográfica, analógica, dele. Máquina que sempre me ensinou mais do que a dominei. Fotografar não é só uma arte; fotografar é uma técnica. A máquina já tem a sua subjetividade através da sua lente: uma fish eye já não “diz” a mesma coisa que uma tele-objetiva. Como se colocar entre a lente e o filme, a ser impresso, é a grande questão, o grande desafio. Adotar a função do espelho/obturador é a sina do fotógrafo. Nada é fortuito. Nada é fruto do acaso.

A fotografia, como a de cinema, é um tiro no escuro. Vik Muniz já dissera, aqui em Fortaleza (citando alguém de quem não lembro, e, se duvidar, nem ele se lembrou), que a fotografia era o recorte no espaço-tempo de algo que o fotógrafo (sujeito com um olho no visor e outro fechado) não viu, não presenciou: a fotografia é para o fotógrafo a lembrança do momento que ele não viu (a partir do momento em que quando ele bateu a fotografia, o obturador escureceu a sua vista e, portanto, não viu o que acontecia na hora, no instante da fotografia).

Ao adquirir movimento, a fotografia já deixa de ser a representação de um instante e passa a representar uma secessão de instantes.Como formado em escultura, sei que o volume só se dá com a luz, só existe por causa da luz. É, então, difícil, escolher entre o volume e a luz. Eu me diplomei em “volume” e me deparo com uma matéria que sempre me atraiu (se é que não me incitou a seguir a carreira que segui). Mas essa matéria não é traiçoeira só porque ela existe pelo simples fato de que se há luz, há escuridão, e sim porque os/nos/me representa.

Diretor de fotografia atira no escuro. Ele não sabe qual será o resultado final: ele faz idéia, mas não sabe com 100% de certeza. Já um diretor de arte (para o qual eu já tenho mais inclinação) sabe, ao montar o set, se o trabalho dele funciona ou não. O diretor de fotografia tem de confiar, além de em si mesmo, nos profissionais envolvidos no tratamento do seu trabalho: a película. É uma profissão de fé. É uma profissão que além da sensibilidade requer conhecimento técnico: que lente, que luz, que ângulo, etc.

Diretor de fotografia sabe e ousa, só não sabe se o que ousa caberá. Diretor de fotografia é um ser estranho, paranormal, que já pré-sente o que virá, pelo menos, o que virá na tela. Ele tem um pleno e total conhecimento de lentes, filtros e efeitos e das suas respectivas conseqüências visuais. Ele é o pintor da tela. O diretor de arte escolha qual objeto e onde ele será colocado; já o diretor de fotografia escolhe o que e como mostrá-lo ou escondê-lo.

Se o diretor de arte brinca com os objetos, o diretor de fotografia brinca com como eles vão aparecer na tela. Como ele vai dar o devido volume, ou não, a eles. Além de tomar decisões cruciais para o filme (para cada fotograma), o diretor de fotografia ainda tem que se preocupar problemas inerentes ao roteiro: seqüência de cenas, continuidade, verossimilhança, etc.

Nunca pensei em ser diretor de fotografia, talvez por nunca ter sentido firmeza nas minhas escolhas fotográficas. Essa semana de aula tanto me apavorou quanto me fascinou para com o assunto e a técnica tratados. Ser diretor de fotografia soa vários tiros no escuro e a cada tiro: um clarão. Dirigir a fotografia é o mesmo que decidir para onde vai cada raio, cada facho, cada sol ou cada lua. Até receber o copião, ser diretor de fotografia é, talvez, uma das mais vulneráveis funções do set de filmagem: a função que ao mesmo tempo é a que mais manda (e desmanda) e a que mais é cobrada.


Gilles Weyne
Artísta plástico e aluno da Escola de Audiovisual de Fortaleza

quinta-feira, 4 de outubro de 2007

Quinta, 4 de outubro de 2007

só a arte
sobrevive

o resto
morre e vira pó

sábado, 15 de setembro de 2007

Amantes Constantes, de Philippe Garrel


Uma rápida leitura de “Amantes Constantes” por Luiz Pretti

O filme de Phillipe Garrel está em cartaz no Espaço Unibanco do Dragão do Mar desde sexta-feira passada e provavelmente sairá de cartaz hoje (uma semana depois de sua estréia). Portanto quem viu teve sorte e quem não viu dançou (a não ser que baixe o filme na internet). Dito isso, podemos começar a pensar justamente na importância desse filme ter entrado em cartaz aqui em Fortaleza e no que isso implica. O fato de ter sido o primeiro filme do Garrel a ter entrado em cartaz, inclusive no Brasil, e sendo ele um cineasta de mais de trinta anos de carreira, podemos primeiramente constatar que existe um problema sério de acesso a um certo tipo de cinema e que isso empobrece o nosso campo referencial. Mas parando com reclamações (ou começando outra?), é mais importante pensarmos no que significa para nós assistirmos a este filme. Aqui entramos num problema que, de certa maneira, é extra-cinematográfico: o problema “vida”. Até que ponto a vida que levamos consegue absorver a três horas de um filme não só altamente reflexivo, mas extremamente crítico e que exige uma postura crítica (atenta) do espectador? A resposta é simples: uma semana em cartaz com uma sessão por dia e a sala do cinema vazia, ficando mais vazia ainda ao final da projeção. Em última instância é sobre isso que o filme fala. Não existe mais espaço para essa arte em nossas vidas.
Por outro lado, o filme nos permite respirar, um respiro profundo, um ar que nos enche de vida e nos dá a esperança de que ainda é possível um olhar, ou melhor, os olhares. Eu digo os olhares pois, são eles que povoam o filme e são eles que enriquecem o filme de uma tal maneira que fica impossível apreendê-los num primeiro instante. Porém há uma certa decupagem dentro do filme que evidencia a relação profunda entre os pontos de vista na diegese e fora dela. O olhar nos norteia a tal ponto, que a própria câmera se torna um olhar que se torna o nosso olhar. E qual é esse olhar? É o olhar inquieto que reconhece que existe um fora de campo, mas que não consegue agarrá-lo. O olhar é fugidio e indomável. Então a escolha do Garrel na construção de sua decupagem e da sua montagem é absolutamente genial, pois o trabalho dele é menos em cima de tempos mortos do que de tempos reflexivos. E é justamente na duração do plano onde se faz a crítica. O casal se olhando, os drogados olhando, a câmera olhando é na verdade o tempo que Garrel nos dá para olharmos a nós mesmos e olharmos para o filme dele de forma crítica. É esse tempo reflexivo que possibilita estarmos tão envolvido com o filme (não existe um distanciamento do ponto de vista da câmera) e ainda assim sermos capazes de criticar o que num último momento seria a nossa própria intimidade e a nossa relação com o mundo que nos envolve.
Nesse sentido é um filme que se abre muito para a vida e a sua complexidade. É um filme triste, melancólico, mas não é só isso. É um filme sobre a solidão (certamente a solidão que o próprio Garrel sente como cineasta). É um filme sobre a morte de uma geração (muito bem posta na cena em que o viadinho pira e não tem ninguém olhando pra ele. De novo a questão do olhar). Mas é também um filme sobre a necessidade de realizarmos obras independente de o mundo querer ou não as obras que temos para oferecer. É onde eu penso: se não querem eu vou enfiar goela abaixo. Portanto, sim a vida é uma merda e as nossas vidas não conseguem mais abarcar um filme como esse, mas isso não é razão para deixarmos de fazer o que queremos (aqui falo como cineasta) e acreditar que ainda existe uma brecha na qual podemos nos inserir.



Luiz Pretti

sexta-feira, 14 de setembro de 2007

Cinecaolho :: Segunda 17 de Setembro

Nessa segunda-feira, o Cinecaolho segue a programação de curtas produzidos no Ceará.

KOKORONOIRO
de Fred Benevides
Ficção, 2007, 20min

NO CAMINHO DE CASA
de Ythallo Rodrigues
Video-fotografia, 2007, 3min

AUSÊNCIA
de Ythallo Rodrigues
Video-fotografia, 2006, 3min

MARAHOPE 14/07
de Alexandre Veras, 2007, 15min

Após a exibição dos filmes haverá um debate com os realizadores.

O Cinecaolho é um espaço alternativo de exibição, organizado pelos alunos da Escola de Audiovisual de Fortaleza e idealizadores do blog Cahiers du Ceará.

Local: Cine Benjamin Abrãao, Casa Amarela Eusélio Oliveira, 2591 - Benfica
Entrata gratuita.

Crítica :: Poeta de Sete Faces, de Paulo Thiago

A verdade que falta sentida na pele
por Ythallo Rodrigues

Fora há alguns anos, morando ainda no Cariri, quando ouvi falar deste filme, “Poeta de Sete Faces”, de Paulo Thiago (diretor de “Policarpo Quaresma: Herói do Brasil”). Estudante de literatura brasileira que era e completamente apaixonado pela poesia do poeta itabirano, Carlos Drummond de Andrade. Ainda sem nenhuma intencionalidade maior pela arte audiovisual, fiquei instigado com a possibilidade de poder ver retratada na telona a poesia do grande poeta. Infelizmente, este filme não chegou ao cinema da minha cidade, como quase todos os filmes brasileiros (mas isso é um outro problema). Eis que hoje, cinco anos depois e estudante de cinema em Fortaleza, tenho a possibilidade de ver este filme.
Pois bem, comecemos do início. Este filme não poderia ser mais decepcionante (para não falar trágico), no que concerne aos aspectos poéticos e principalmente aos cinematográficos. Um documentário que em sua sinopse se diz um documentário poético, deveria no mínimo presar pela poesia de suas imagens e de seu som. No entanto, o que vemos é uma seqüência infame de narrações, depoimentos, imagens redundantes, reconstituições, entre outras obviedades, que tornam cada fato narrado absurdo, aliás, se fosse pelo menos absurdo teria uma carga poética, talvez a palavra exata seja pífio. O filme tenta a todo custo se agarrar aos textos do poeta, que a todo momento são lidos, muitas vezes e inclusive pela metade, e ao melodrama de uma possível vida simples, na qual Carlos Drummond de Andrade se acobertou por toda sua existência.
Em certo momento de sua carreira Charles Chaplin disse: “A beleza é a única coisa preciosa da vida. É difícil encontrá-la – mas quem consegue, descobre tudo.”. É patente a sensação de que o cineasta – do também ruim Policarpo Quaresma – neste filme, não encontrou ou sequer tentou encontrar a beleza magnífica nos versos do poeta de sete faces. Tudo no documentário é de plástico, sem alma e sem verdade poética ou cinematográfica, percebe-se isso mais nitidamente na forma como os grandes atores Othon Bastos, Paulo Autran, Paulo José, entre outros, recitam os poemas, é tão fake que jamais condensariam naquelas palavras jogadas ao vento e de tal forma, a sensibilidade poética drummondiana. Sem contar os indefectíveis cenários que reforçam ainda mais a sensação de veleidade das imagens.
Mas quando tudo parece perdido vem o pior, existem dois momentos que são, absolutamente, memoráveis (no mal sentido). O primeiro é logo no início do filme quando o guitarrista Samuel Rosa toca e canta flutuando sobre um croma bizarro, o magistral “Poema de Sete Faces”, e pior a música que foi composta e acompanha as imagens é no mínimo tosca. É impossível, sendo um observador um pouco atento e minimamente sensível, não perceber o nível de distorção audiovisual que esta cena causa, é uma verdadeira aberração e no meu ver um desrespeito a uma obra emblemática da nossa literatura.
Por fim, a seqüência final. São imagens em câmera lenta de belíssimas mulheres fazendo cooper no calçadão de Copacabana, que não deixam nada a dever a uma propaganda da campanha contra diabetes, no entanto essas imagens ilustram a narração da última fase poética de Carlos Drummond, na qual o poeta fez poemas eróticos e de elogios carinhosos às mulheres, segundo a narração.
Enfim, nestas minhas observações, posso estar parecendo pretensioso falando palavras tão severas sobre um filme de um cineasta brasileiro com vários longas-metragens em seu currículo e tal, no entanto, devo admitir que não preciso insistir em achar algo de interessante na filmografia deste cineasta brasileiro.
Ythallo Rodrigues

Como ser um Gênio :: Flávio Simões

Pra ser um Gênio é preciso acreditar na mentira
E disfarçar a verdade
É preciso escolher os meninos certos
Pois eles são a garantia da autenticidade

Pra ser um Gênio é preciso roubar
E manter-se autônomo
Na corda bamba dos gostos
Até descobri-se um dono

Pra ser um Gênio é preciso convencer sem falar
Enxergar com os ouvidos e escutar com os olhos
É preciso misturar os ingredientes
À tinta e a óleo

Pra ser um Gênio necessita-se de uma fina ironia
Não necessariamente com uma rima
Mas acima de tudo não esquecer
Das covas rasas dos leões

Pra ser um Gênio é preciso inventar o inevitável
Mergulhar no destino em busca do acaso
É preciso ser misterioso
Recitar palavras mágicas
E por fim, fazer um pacto com Satanás

É isso, não é tão difícil assim ser um Gênio
Basta apenas algumas palavras escritas num papel
Agora preciso ir...
Boa sorte, vou encontrar-me com Papai Noel.


Flávio Simões

quinta-feira, 6 de setembro de 2007

Cinecaolho :: Segunda 10 de Setembro

O Cinecaolho - para quem não conhece, cineclube realizado toda segunda pelos alunos da Escola de Audiovisual de Fortaleza - segue com a exibição de curtas produzidos no estado:

Porto de Jangadas
Direção: Déo Cardoso
2006

Às vezes é melhor lavar a pia do que a louça, ou simplesmente Sabiaguaba
Direção: Luiz e Ricardo Pretti
2006
Seleção oficial do Festival de Oberhausen, na Alemanha, 2007
Crítica de Marcelo Ikeda no link:
http://www.secult.ce.gov.br/clipping/clipping.asp?codigo=3923


Lembrando que o Cinecaolho está temporariamente sendo realizado no Cine Benjamin Abraão, na Casa Amarela Eusélio Oliveira: Av. da Universidade, 2591 - Benfica

Crítica :: 95 Cabeças, de Gabriel Silveira :: Antes do Sangue, de Thaïs Dahas









95 cabeças e Antes do Sangue

Dois trabalhos compostos de imagens eletrônicas passaram no Cinecaolho no dia 3 de setembro para alguns “privilegiados”. Eu fui um desses privilegiados que me arrisquei e fui assistir a dois trabalhos no mínimo interessantes, feito por jovens que vivem em Fortaleza, mas habitam o mundo (característica predominante, talvez, em toda a minha geração, que nasceu no começo dos anos 80).
Foi muito oportuno poder ver os dois filmes seguidos um do outro, pois eles dialogam em vários aspectos, mas também divergem em outros. Os dois filmes estão claramente inseridos na tradição das vanguardas cinematográficas que dialogam com as outras artes e que buscam novas formas de percepção da imagem (como quis os textos de Jean Epstein). Mas enquanto 95 cabeças destrói o realismo da imagem, e expõe de maneira sutil o seu dispositivo (efeito-câmera – em um celular?) concluindo que toda imagem não transcende do lugar de onde ela é criada, Antes do Sangue parte para um reencontro com a imagem realista a partir da rarefação da imagem eletrônica em p&b.
Se 95 cabeças dialoga com Brakhage é só na superfície, pois enquanto Brakhage procura um primeiro olhar (apesar de fantasmagórico), anterior à Linguagem, 95 cabeças procura o fim do olhar, posterior a todas as tentativas de Linguagem. Eu poderia não olhar para aquelas imagens (?) em 95 cabeças, mas eu insisto em olhar e é aí que reside a sua força. 95 cabeças não acredita na possibilidade de uma representação, não é só a história que não existe, mas também a própria narrativa. Se existe uma narrativa ela é constantemente deslocada, pela evidência de que a imagem não existe mais, ou não quer existir. Mas algo continua existindo. O quê? Não são fragmentos da realidade e nem distorções do olhar, o que resta é a duração. A duração se força ali em cada imagem e cada som e ao final do filme eu saio com a sensação de que eu vivenciei uma duração que toma conta do meu espírito (da minha percepção) e torna o mundo não num discurso, mas em um pensamento, e nesse sentido 95 cabeças é um trabalho militante (no bom sentido da palavra, sem demagogias, por favor!) que talvez retome uma atitude auto-crítica que lembre os filmes do grupo Dziga Vertov, apesar desse trabalho ainda manter uma relação muito inocente (a-crítica) com a imagem.
Antes do Sangue poderia ser uma homenagem ao cinema de Jean Cocteau, Maya Deren e Luís Buñuel, e o é até certo ponto. As imagens de Antes do Sangue são auto-reflexivas, através dos jogos de espelhos (reflexo do reflexo...) e da transparência (não no sentido Baziniano) de sua enunciação (sabemos como o trabalho foi feito através do próprio filme). Em Antes do Sangue quase não existe um enunciado e nesse sentido ele se distancia dos cineastas acima citados, pois eles trabalhavam com a descontinuidade dos enunciados cinematográficos e não com a sua rarefação. As imagens que vemos são estáticas e as telas pretas confirmam esse estado, mas um elemento (o som!!!) transgride essa inércia e desmistifica a própria auto-reflexividade criando mais uma camada de auto-reflexividade e assim dando espaço pra vertigem e pra fissura. Estamos no ponto de encontro entre a realidade e o sonho, entre o feio (a imagem pobre construída por reflexos) e o belo (a intensidade de um sentimento intraduzível: a mulher). O impossível e o possível se desejam mutuamente. Eu, particularmente, me encanto com Antes do Sangue pela sua simplicidade intensa, e porque existe um pensamento sobre o estatuto da imagem. Eu não acho que seja um filme pessoal (até porque existe a participação “subterrânea” de Guto Parente, o namorado da realizadora), talvez um filme de casal, mas também não. Eu acho que seja um filme arquetipal (seja lá o que isso for).
(Obs.: note que eu só utilizei o termo filme no final do texto.).

Ricardo Pretti

sábado, 25 de agosto de 2007

Filme "fechado" e filme "aberto"

Fala-se muito em filme "fechado" e filme "aberto", sendo que o primeiro é sempre subjulgado pelo segundo, ora,!! se pararmos para pensar mais delongadamente, perceberemos que essa afirmação só realiza-se à priori e que sua única distinção está contida na proposta que estar "à seguir" e "em "seguir"", e é claro, pelas aspas!
Flávio Simões.

quarta-feira, 15 de agosto de 2007

Vilas Volantes :: Alexandre Veras :: 2005

Os espaços são efêmeros, surgem e se dissipam de acordo com a ação dos ventos. As dunas que deslocam-se abrindo terreno para o nascimento de novas vilas engolem aquelas que encontram pela frente. O passado dos moradores, soterrado pela areia, ressurge através de projeções de suas memórias, alimentadas pela imaginação de cada um. As múltiplas verdades transformam-se em História quando acordos são estabelecidos entre as testemunhas do passado. Os dois velhinhos que nos guiam através do espaço virtual da vila onde viveram, Vicente Pedro e Chicó Pedro, constroem juntos os causos daqueles tempos. As peças de um encaixam-se nas do outro e o passado ganha vida. Além dos dois, Vilas Volantes apresenta outros quatro personagens: Dona Bil, Burica, Mané Pedro e Luis Quirino. O documentário começa com Dona Bil. A plasticidade das imagens que mostram esta simpática velhinha catando siris já indica o apuro de Alexandre Veras na composição de cada plano, tanto no que diz respeito aos enquadramentos e à movimentação interna dentro deles, quanto, principalmente, ao cromatismo das imagens: há um evidente trabalho de pintura de suas superfícies. As cores do filme são mais vivas que as cores do mundo. Sua fotografia não tenciona atribuir um valor de verdade às imagens, o que seria, provavelmente, algo inconsistente, já que a “verdade” da obra localiza-se na memória de seus personagens, em seus verbos, e não num possível flagrante imagético do real. Vilas Volantes é um documentário onde podemos identificar elementos do cinema clássico - decupagem que segue uma certa ordem de planificação, alguns raccords, cortes suaves – combinados a elementos da video-arte e do cinema experimental. A concepção sonora do filme – seu maior campo de experimentações –, assim como a fotografia, não tem intenção alguma de cumprir o papel de registro da realidade. Há, sim, um trabalho de construção de uma outra realidade, fílmica, uma postura consciente e explícita do diretor diante da recorrente problemática em torno dos limites entre ficção e documentário. Vilas Volantes não apresenta-se como um recorte da realidade, o que o distancia bastante dos documentários clássicos tradicionais. Há uma construção que se faz presente. É evidente a influência de Kiarostami nesse sentido e de Tarkovski, no que diz respeito à relação imagem-tempo, à sugestão de um olhar mais contemplativo por parte do espectador. Apesar de tratar de espaços efêmeros, Vilas Volantes é um filme que permanece, como o passado projetado pela memória de seus personagens, sempre em mutação, passível de constantes re-significações, vivo.

Guto Parente.

Breve Introdução

O blog Cahiers du Ceará se propõe a estimular a discussão em torno de questões estéticas, filosóficas, estruturais, conceituais, etc. do que vem sendo produzido no cinema & vídeo contemporâneo: sejam produções do nosso estado - carentes de um espaço de discussão -, sejam produções de outros estados ou países.
Trata-se de um espaço de discussão coletivo, aberto a participação daqueles que desejarem expressar suas idéias e opiniões relevantes ao desenvolvimento de uma reflexão mais elaborada no campo do audiovisual, ou qualquer outra esfera da arte.

Para postar no blog Cahiers du Ceará envie seu texto para: cahiersduceara@gmail.com